domingo, 3 de novembro de 2013

Crítica: Bioshock Infinite

Disponível para: Xbox360 (versão testada), PS3, PC.



Quando foi lançado no início do ano, este jogo era considerado por quase todos os críticos de games como “revolucionário”. O motivo de eu querer me aventurar nesse ramo é apontar para esses pseudocríticos que puxam o saco de qualquer jogo “bonitinho” (desculpe, eu tenho que zoar essa obsessão absurda por gráficos) e “pra macho” (como se não tivessem mulheres e crianças que gostam de jogar).

Bioshock Infinite não é revolucionário porque é um FPS (gênero extremamente popular) que tem dois dos mais presentes clichês dos videogames: A “donzela em perigo” e “vilanização dos movimentos sociais”.

É impossível contar a sinopse do jogo sem soar machista, mas vamos lá: você é Booker DeWitt (ou o fantasma dele, já que nenhuma parte do corpo é visível), um ex-veterano de guerra é chamado para uma missão na cidade de Columbia. O objetivo: resgatar Elizabeth (considerando que ela é filha do Zachary Comstock, que é dono da cidade, ela é tecnicamente uma princesa) que está presa em uma torre em forma de anjo (ela refere a palavra torre pelo menos duas vezes no jogo) sendo protegida por um robô meio-dragão meio-papagaio.

“Mas ela tem superpoderes”. E daí? Mesmo tendo poderes de abrir portais para dimensões diferentes (sendo capaz de fazer literalmente qualquer coisa), é incrível a posição passiva que Elizabeth ocupa em todo o jogo, servindo apenas para abrir fechaduras e dar munição e kits médicos. A mensagem está clara: não importa o quanto a mulher seja forte, ela sempre precisará de um “macho-alfa” para protegê-la.

O segundo ato do jogo (leia-se meio) se resume a ele querer retorná-la aos quem forneceram a missão para ele (mesmo ele sem saber quem exatamente deu a missão para ele) e ela querer viajar para conhecer o mundo (afinal de contas, ela ficou 20 anos presa em um quarto). Aí que entra o segundo grande clichê.

Columbia funciona em um sistema de fundamentalismo cristão governado por Zachary Comstock, um padre visionário que moldou a cidade sobre sua imagem e semelhança. Porém a vilã (tinha que ser mulher) do jogo é Daisy Fitzroy: uma ex-empregada doméstica de Comstock, negra, lésbica (só faltava ser feminista e gorda também) e líder do grupo Vox Populi (a voz do povo, em latim), um movimento popular insatisfeito com a situação da cidade onde Comstock e seus aliados detém quase toda a riqueza da cidade.

Como o jogo vilaniza a Daisy? Elizabeth e Booker tenta fugir de Comstock pulando para uma outra dimensão onde a Vox Populi destrona Comstock com a ajuda de Booker. O q aconteceu? A cidade entra toda em ruínas e despedaça literalmente sob o comando autoritário de uma ditadura comunista. Pois é, MAIS UM jogo falando sobre a “ameaça comunista” (já não basta os Call of Duty anuais e seus inúmeros imitadores). Ou seja, a mensagem do jogo também parece ser: sim, o capitalismo é uma merda, mas pelo menos não estamos no comunismo. “Revolução dos bichos” tudo de novo. Eu entendi que a intenção é fazer um “Efeito Borboleta” sobre a história, mas tem melhores maneiras de se fazer isso.

Os design de níveis são péssimos: as fases demonstram claramente que não foram feitas para serem jogados em primeira pessoa (o jogo adora te colocar em salas redondas e ovais para te atingir por trás); é aberto demais para ser um “shooter” e estreito demais para ser um “sandbox”, o combate mão-a-mão é completamente desfocado (apesar de ser divertido fatiar racistas com uma motoserra estilizada) e é necessário saber onde pisa depois de usar uma gôndola (que, repito, não dá para ver os pés),  como se a gôndola por si não fosse complicado o suficiente para usar. Mapa? Tem na entrada de cada bairro e só. Missões secundárias? Confuso demais para entrar e os prêmios não compensam.

Sobre a jogabilidade, é estranho notar que, apesar de estar disponíveis para usar poderes sensacionais, como atirar corvos assassinos, fazer o inimigo suicidar, dar choques, levitar os inimigos; esses elementos são extremamente limitados e a mecânica principal do jogo é atirar em uma pistola estilizada, que soa como uma pistola comum.

Ah, você quer ler sobre o q tem de bom no jogo (como se todos os críticos já não estivessem tocado nesse ponto)? Tudo bem...

Columbia é uma cidade sobre as nuvens, erguida por balões e dirigíveis, uma “Veneza dos céus”. E a primeira vez que esta cidade é introduzida aos jogadores (enquanto o personagem está dentro do foguete), mostra-se a principal virtude do jogo: uma cidade dourada, linda, limpa e pacífica (afinal de contas, foram torrados 100 milhões de dólares para fazer aquela cidade virtual).

O mais legal é que os “gráficos” do jogo tem um objetivo narrativo e não só para agradar os “hardcore” que só gostam de gráficos. Uma cidade linda, limpa e pacífica mostra-se violento, sangrento, sujo e corrompido durante todo o jogo, passando a mensagem de que tem sempre algo de podre em um paraíso.

Apesar de não ser um jogo de terror (como o original Bioshock), os conceitos de cidadania ativa, patriotismo,religião, liberalismo, racismo e grande desigualdade social são mostrados com soberba é algo de meter muito medo, mostrando não ser muito diferente da decadente Rapture. Se fosse jornal, Bioshock Infinite seria “O Pasquim”: é fofo usar um discurso contra o racismo e as disparidades sociais, mas misoginia é obrigatória.

É nítido que os criadores do jogo tem uma admiração por “Star Wars”: A cidade é praticamente armada (assim como a estrela da morte), a primeira vez que Elizabeth é introduzida no jogo ela aparece dançando do lado da cabine de cinema que está passando “Star Wars” e até o “plot twist” é semelhante.
Falando do final: é um dos melhores finais já existentes nos videogames (não estou me referindo a fase final, que era uma bagunça em questão de design) pois demonstra que a história não é sobre Columbia ou Elizabeth. É sobre Booker, é sobre culpa, sobre pecados, como lidar com essas situações.


Depois de estar em guerras que dizimaram milhares de pessoas, como é que Booker vai lidar que esteve na chacina? Aposentando e bebendo, torcendo para que ele nunca mais se lembre daquilo; ou mudar toda sua identidade e usar os seus pecados como fundação de uma nova cidade? De qualquer maneira, são dois exemplos de auto-destruição, algo que vários críticos podem estar fazendo ao adorar esse tipo de jogo, demonstrando que a indústria dos videogames envelheceu antes mesmo de amadurecer e admitindo culpa em algo que não merece ter culpa alguma (ser divertido e apelar para outros públicos-alvo que não sejam homens brancos héteros de 18-40 anos).

2 comentários:

  1. Quando eu vi o trailer de bioshock infinite (aquele que a elizabeth tem a franja reta),eu achei que seria um jogo foda com uma personagem foda do seu lado, e que você teria mais dificuldade em atirar nos inimigos antes deles cairem mortos pela garota, esperei esse lado dela até o final do jogo(na verdade, to esperando ate hoje xD).
    Já ouvi gente falando que se bioshock fosse protagonizado por uma mulher (booká dewiita?) sem mudar muita coisa, ele poderia ser melhor, mas nao lembro os argumentos usados...mas enfim.

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    1. Nyu-chan,

      O que me interessou no "bischock infinite" foi a parte "bioshock". Tipo, o jogo original funciona porque ele é o contra-argumento perfeito da "Revolta de Atlas" de Ayn Rand (Andrew Ryan = We R Ayn Rand). A cidade pós-apocalíptica de Rapture é um retrato de como funcionaria de verdade a Atlantis de Ayn Rand (um lugar onde o estado-malvadão não existiria). Os superpoderes estão lá apenas para hiperdimensionar a situação.

      Eu não gosto muito de falar sobre a dificuldade do jogo porque algo que pode ser fácil para mim (alguém que joga desde criança) pode ser algo muito difícil para quem está começando a entrar na mídia dos games.

      Bioshock Infinite é, basicamente, um jogo onde dois pais lutam pela guarda (ou posse) da filha. Colocando Booker como mulher seria uma maneira muito interessante de tocar no assunto da guarda de filhxs (disputar a guarda com um pai abusivo), mas provavelmente Ken Levine iria interpretar como um: "malditas mulheres que roubam as nossas casas e nossas filhas", além de lembrar que o protagonista e o antagonista são a mesma pessoa e a de que a filha ainda estará fazendo o papel de "princesa indefesa".

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